Este trecho, do livro “O poder do hábito”, de Charles Duhigg, enfatiza muito bem o tema central deste artigo. Veja:
“Durante uma turbulência, os hábitos organizacionais se tornam maleáveis o bastante tanto para alocar responsabilidade quanto para criar um equilíbrio de poder mais imparcial. Na verdade, as crises são tão valiosas que às vezes vale a pena avivar um senso de catástrofe iminente em vez de deixar a coisa assentar.”
Em tempos de crises, reorganizações, análises da saúde operacional e financeira das empresas, entender como está o posicionamento salarial da companhia, junto a todos os colaboradores, é muito importante para garantir passos firmes e duradouros visando o futuro próximo. Por isso, além de serem valiosas, as crises são uma grande oportunidade para tocarmos no assunto.
Podemos entender a remuneração não somente pelos valores pagos e benefícios concedidos, mas também pelos valores intangíveis, não mensuráveis facilmente. Valores intangíveis que são sentidos fortemente pelos colaboradores e que influenciam nas tomadas de decisões, como por exemplo: cultura organizacional, relacionamento, qualidade de vida, comunicação, modelo de gestão, ambiente de trabalho, entre muitos outros.
A remuneração também pode ser entendida pelo conjunto de recompensas oferecidas ao colaborador. E, estar atento ao que é estimulante nas recompensas nos períodos é um papel importantíssimo e contínuo da área de Gestão de Pessoas em conjunto com os gestores das equipes, tanto na crise quanto no crescimento.
O mercado tem exigido cada vez mais essa abordagem com maiores detalhes. Grupos mais operacionais, outros grupos mais técnicos, outros ainda com perfis mais administrativos e diretivos, enfim, entender o que é relevante para os diversos grupos passa a ter uma fundamentação prática altamente exigida para poder visualizar o que os mercados têm ofertado e o que sua empresa vai aplicar estrategicamente na sua estrutura.
Antes de aplicar, o primordial é entender o comportamento dos mercados e definir como a sua empresa deseja estar competitiva nesses cenários. Ter esse monitoramento constante ajuda na tomada de decisões e minimiza diretrizes equivocadas e não sustentáveis.
Fazendo uma analogia com o mundo dos esportes, podemos ilustrar com a complexidade do mundo da Fórmula 1.
Temos os engenheiros das equipes, que têm como função entender todos os detalhes do carro e condições das diferentes pistas que eles encontrarão, ao longo da temporada de competição.
Esses engenheiros precisam estar antenados nas novidades tecnológicas e garantir que o carro poderá ter o melhor desempenho possível nas diferentes pistas e diferentes climas e temperaturas.
Esse carro será guiado por um piloto. O piloto deverá ter um carro nas melhores condições para alcançar seus objetivos práticos na competição. É o piloto que irá sentir as dificuldades na condução do carro e reportar aos engenheiros toda essa experiência prática para melhoria contínua das características do carro.
Bem, no “mundo da remuneração”, podemos entender o papel dos engenheiros como o da equipe de Gestão de Pessoas, que é a guardiã de toda a política de remuneração da empresa. E essa guardiã deverá estar atenta a todos os detalhes internos e externos, para poder trazer as melhores situações de aplicabilidade dentro da realidade de sua empresa.
O piloto pode ser referenciado ao grupo de gestores que está na administração direta dos colaboradores. Estão sempre sentindo, na prática, como as estratégias e valores estão sendo estimulantes ou não para os grupos. É esse piloto que deverá trazer continuamente os feedbacks sobre o desempenho e possíveis melhorias nesses processos.
Assim, não há vitória sem a união de esforços dos engenheiros e pilotos. Vejo como válido para as organizações. Não há sucesso nesse assunto sem a sinergia entre Remuneração e Gestores.
Por isso, falar de remuneração na crise vai além de somente entender o momento atual.
Falar de remuneração na crise evidencia a importância de sempre melhorar a sinergia entre essas equipes, buscando o entendimento das realidades e possibilidades de aplicação dos passos consistentes para sustentabilidade do negócio.
Falar de remuneração na crise aponta para a necessidade de ter sua estrutura organizacional muito bem alinhada, planejada, atualizada, e dessa forma ser menos surpreendido por condições adversas.
As crises são comuns em um esporte competitivo e de muita visibilidade, como a Fórmula 1 – ajustes na pilotagem, trocas de pneus, mudança de estratégia, imprevistos, chuva, acidentes, tudo isso acontece durante a competição, com o carro na pista, a 300km/h!
Crises fazem parte do dia a dia dos pilotos e engenheiros. Com certeza, há uma lição valiosa a ser aprendida aqui.
As empresas também competem num cenário de disputa – muitas vezes, acirrada – e a resiliência, sinergia e organização, com certeza, são ferramentas que o RH precisa carregar consigo, porque, assim como nas pistas, momentos de instabilidades não definem, necessariamente, o desfecho da corrida
Rafael Rodrigues Silva
Gerente Consultoria de Remuneração