Pedro é gestor de Remuneração em uma empresa de grande porte do setor metalúrgico. Em 2021, aguardou o acordo coletivo firmado pelos órgãos da categoria para conceder o reajuste salarial aos colaboradores da sua empresa. O percentual acompanhou a inflação – que está em níveis recordes no Brasil. Agora, em 2022, Pedro foi consultar um cargo específico na pesquisa salarial e teve a non grata surpresa de perceber que a evolução salarial não foi tão grande quanto esperava.
Se você se identificou com a história do nosso personagem Pedro, saiba que essa é a situação de muitos gestores Brasil afora, que dia a dia se questionam por que há disparidade entre os acordos coletivos e as evoluções salariais. É verdade que os salários NÃO estão acompanhando a inflação – e este conteúdo tem o objetivo de explicar os motivos.
Inflação versus variação salarial
O primeiro ponto de atenção é que um cargo específico não deve ser tomado como base para análises profundas. Mas o mais recente estudo de Indicadores de RH da Carreira Muller realmente comprova: a evolução salarial não tem acompanhado o INPC, índice usado como referência para reajustes salariais.
O estudo traz dados por região, segmento e nível hierárquico. Ao pegarmos como exemplo o nível de analista, percebemos que a variação salarial acompanha o INPC em 2016 e 2017. A partir dali, vem se distanciando progressivamente até chegar nos números que vemos atualmente.
Em 2021, enquanto o INPC estava em 10,16%, a evolução salarial dos níveis de analistas permaneceu em 3,29%. No ano anterior, os números estavam em 5,45% e -4,45%, respectivamente. Em outros níveis hierárquicos, a situação é ainda mais crítica no balanço mais recente.
- Executivos: evolução de 1,72% em 2021;
- Coordenadores e especialistas: redução de -0,24% em 2021;
- Engenheiros: 2,17% em 2021;
- Técnicos: 0,89% em 2021.
O maior crescimento está no nível operacional, de 3,15% em 2021. Você pode acessar o estudo completo de Indicadores de RH, comprovar que os salários realmente não estão acompanhando a inflação e acompanhar nossa análise sobre o assunto. Basta entrar em contato com a Carreira Muller e solicitar seu acesso à plataforma.
Fonte: Estudo Carreira Muller: Indicadores de RH / Evolução Salarial | página 26.
Mas, por que isso tem acontecido?
Antes de tudo, é importante ressaltar que há muitas forças que influenciam na evolução salarial: o INPC não é, por incrível que pareça, o único responsável. Vale a pena destacar 3 pontos:
1. Acordos coletivos não acompanham o INPC
Por mais contraintuitivo que seja, é o que acontece. Se observarmos os números dos últimos 12 meses, 45% dos acordos coletivos fecharam abaixo do INPC: enquanto o índice de referência girava em torno dos 12%, o reajuste médio aplicado esteve em 7,7%, o que corresponde a quase metade do percentual.
2. Movimentações individuais importam
Índices individuais são, na maioria das vezes, subestimados diante dos acordos coletivos. No entanto, ambos têm praticamente o mesmo peso e deveriam ser igualmente considerados. As promoções, por exemplo, são movimentações que causam impactos negativos nessas pesquisas – tanto nos dados do cargo antigo quanto nos do cargo ascendido.
Vamos retomar o exemplo do “analista”. Caso ele seja ascendido de junior a pleno, sua “saída” do mercado terá impacto no salário antigo. E como ele foi promovido recebendo o salário-base do novo grade, essa promoção também influenciará nos índices salariais de um analista pleno.
3. Dança das cadeiras
Os indicativos de turnover, no Brasil, são muito significativos. A rotatividade em nosso País está em mais de 40% anualmente, o que significa que quase a metade do quadro de empregados se renova continuamente a nível Brasil, de acordo com dados oficiais do Ministério do Trabalho.
Essa “dança das cadeiras” acaba sendo muito prejudicial para os valores de mercado. Afinal, quem deixa a empresa já teve reajuste e quem entra geralmente é contratado pelo piso salarial. Resultado: queda do salário mediano.
Os reajustes afetam todos os cargos da mesma maneira?
A resposta é não. Se o impacto causado pela inflação não é linear, os reajustes também não devem ser. Colocar toda a equipe em uma mesma cesta e aplicar o acordo coletivo igualmente para todos os funcionários não é aconselhável.
Primeiro porque os cargos não variam da mesma maneira. Por conta da alta demanda e da falta de profissionais qualificados, alguns cresceram muito acima da inflação, como é o caso da área de Tecnologia da Informação (TI). Em contrapartida, há os que caminharam na contramão e, mesmo com a inflação alta, perderam valor mediano salarial. Portanto, é necessário pesquisar e analisar caso a caso antes de aplicar os reajustes.
O segundo ponto é que os efeitos da inflação não afetam a todos de maneira equivalente. Cada item (alimentos, eletrônicos, etc.) teve uma variação de preço e a cesta de consumo diverge entre os grupos. Por mais que o INPC seja o índice mais comum para reajustes salariais, não é o mais indicado, por exemplo, para corrigir os altos salários da organização. Leia mais sobre os índices de referência para medir a inflação.
A perda do poder de compra
Falando nisso, é inevitável que a perda do poder de compra seja uma das consequências do cenário atual, em que os índices de inflação estão em cerca de 12% – e os salários não estão acompanhando. Há muitos fatores que influenciam na escalada dos preços: oferta e demanda, capacidade de produção, variações climáticas, Guerra da Ucrânia, política, entre outros.
Isso significa que, por mais preocupado que você esteja em resolver a perda do poder de compra em escala interna, infelizmente estamos lidando com um problema complexo e de escala global, difícil de ser resolvido de maneira individualizada.
O que o RH e a Remuneração podem fazer é estar atentos às variáveis e aos efeitos da inflação. Quanto mais esclarecimento, mais fácil lidar com esses fatores no âmbito corporativo. Quer saber um pouco mais sobre o assunto? Confira nossa série sobre a inflação:
Parte 2: Principais índices de inflação
Parte 3: Formas de se proteger da inflação
Parte 4: Como não cair na armadilha da inflação
Acompanhe também o episódio que fizemos para responder às questões desse tema no Consultaqui.